quarta-feira, 22 de agosto de 2018

O Fado do Velho Príamo (Poesia)

Ivanov, Alexander, Príamo a pedir a devolução do Corpo de Heitor, 1824.
Moscovo: Galeria Tretyakov.

O Fado do Velho Príamo

Despojado de si
Crente em Apolo
Indiferente e ledo
Segue suplicante
De Tróia o rei Príamo

Roga ao meio deus
O corpo do filho morto
Ao belicoso carrasco
Implora o recto juízo 
Clama só a justa morte

Na noite da negra Nyx
Espera sem sorte ou arte
Uma prudente luz
Da luminar razão 
E sem nada almejar
Além da morte certa
Suplica a benevolência
De um cruel algoz

Áquiles surpreso decide
Sem puder recusar
Dar o corpo morto
Aos lúgubres lumes
Nem sempre a espada
Move a ilustre coragem
E pode a superna alma
Ter força de falange

Príamo o suplicante
Fez de glória vã
A vitória de Aquiles
E deu ao morto Heitor
A sombra da dignidade

E na noite avançou
Como vazio vulto 
Para a morte próxima
Pras perdidas ruínas 
Da sua nobre cidade

Assim seguiu despojado
De Tróia o rei Príamo

Assim pela morte vai
E à morte regressa

18/08/2018 RMdF